Wednesday, February 23, 2011
A lição que fica da Mãe Tigre
Nas últimas semanas, li o livro e uma série de resenhas de “Battle Hymm of the Tiger Mother” (Hino de Batalha da Mãe Tigre).
Divido com as mães modernas a lição que tirei dessa imersão profunda no universo de Amy Chua.
Como educar os filhos? Soltar ou prender? Estender a mão ou deixar tropeçar? Quando (e quanto) elogiar e cobrar? Em crise, os pais tendem a seguir a cartilha do politicamente correto, e respeitar a personalidade, individualidade e ritmo de suas crias. Mas, seus filhos parecem cada vez mais indisciplinados, desestimulados e perdidos. O que fazer agora? É nesse contexto que surge Amy Chua, uma advogada sino-chinesa, casada, mãe de duas adolescentes e professora da Universidade de Yale, que lançou nos Estados Unidos o livro “Battle Hymm of the Tiger Mother” (Hino de Batalha da Mãe Tigre), com previsão de lançamento para o segundo semestre no Brasil. Ao relatar as pretensões que alimenta para as filhas e os métodos usados para chegar lá, ela sugere adotar a rigidez extrema num sistema draconiano. Mas, deste lado do planeta, ecoar os tambores de Amy seria puro desespero.
O livro é um escândalo sob a óptica ocidental. Ao educar as filhas, Sophia e Louisa, hoje com 18 e 15 anos, ela segue a lógica chinesa de disciplina, a qual foi submetida na infância e que é dissecada em outros livros de “parenting” (criação). E acrescenta requintes de crueldade de assinatura própria que poucos teriam coragem de admitir. Amy tinha pânico de que as filhas, beneficiadas pelo sucesso profissional dos pais e avós chineses nos Estados Unidos, se acomodassem. A Mãe Tigre acredita que só a dedicação máxima livrará as filhas do declínio, motivo de vergonha ao povo chinês. E que sucesso é, por exemplo, tirar sempre nota dez, estar dois anos à frente de seus colegas de classe, não assistir tevê, não jogar videogame, não dormir na casa dos amigos, não ter o direito de escolher as próprias atividades extracurriculares, não participar de nenhuma atividade que não possa lhe render uma medalha, de ouro, no caso, e tocar piano e violino (como profissionais). Para que seus anseios fossem alcançados, ela tomou as rédeas da educação das filhas e as ensinou pessoalmente o que elas não viam na escola, pelo menos não com tal precocidade. Com 18 meses, enquanto os colegas começavam a contar até dez, Sophia sabia somar, subtrair, multiplicar, dividir, frações e decimais. Aos três anos, a menina lia Sartre e tocava Schumann. A relação de Amy com as meninas é pautada pelo medo e pela agressividade (quando insatisfeita, a mãe chama as filhas de lixo). São raras as manifestações de afeto. Sempre que supervisionava a prática de piano das meninas, ela destilava comentários do tipo. 1) Meu Deus, você piora a cada dia! 2) Eu vou contar até três e quero música! 3) Se a próxima vez não for perfeita, EU VOU JOGAR TODOS OS SEUS BICHOS DE PELÚCIA E ATEAR FOGO! Por tudo isso, Amy inflamou ânimos e, inclusive, foi ameaçada de morte.
Apesar de o “fim” parecer louvável (as meninas têm currículos escolares brilhantes, e aprovam o comportamento da mãe, ao menos publicamente), os “meios” não podem ser recomendados. Especialmente porque não se sabe o tamanho do impacto de tais ações nas meninas. Segundo um estudo do Centro de Controle e Prevenção dos EUA, o risco de suicídio entre universitários chega a ser três vezes maior em descendentes de asiáticos.
Isso não significa que os argumentos de Amy, pelo menos em alguns momentos, não flertam com a racionalidade ocidental. Quando ela diz que as filhas não têm o direito de escolher a sua atividade extracurricular, ela defende que ninguém gosta de nada que não domina. Que a prática leva ao sucesso e ao prazer. Pode ser. Mas, vale a pena privar uma criança de fazer o que gosta? Ao forçar a filha a estudar apenas piano e violino, ela pode ter minado um talento nato para, por exemplo, o teatro e a sua felicidade.
Ainda assim, a mãe oriental deixa às ocidentais algo a se inspirar. Ela sonhou com o futuro das filhas, e se empenhou para que elas chegassem lá. Amy participava das aulas de música das meninas e sentava para estudar junto. Dedicava horas de seu dia a ensiná-las inglês, chinês e matemática. Fiscalizava tarefas e cobrava resultados. Um estudo revela que as mães chinesas dedicam dez vezes mais tempo à educação de seus filhos do que as americanas. E, olha que a história de Amy não dá brecha para a desculpa preferida das mães ocidentais que trabalham fora de que não têm tempo. Da mesma forma que se debruçava com unhas e dentes sobre a educação de suas filhas, ela se dedicava à sua carreira (é autora de aclamados livros de Direito Internacional). Ela, inclusive, deveria escrever um livro sobre como é capaz de fazer isso.
No livro, Amy confessa que acha esquisito os pais aplaudirem os filhos por tarefas banais e conclui que, além de querer mais para os seus rebentos, os chineses têm mais noção da real capacidade das crianças. O desafio é encontrar o meio termo. Não pegar tão pesado, nem errar tanto, mas também não minimizar o potencial de nossos filhos, nem deixar de estimulá-los nós mesmos. A impressão que fica é que o sucesso dos filhos é proporcional ao empenho dos pais. E que eles podem chegar lá, por mais distante que sua estrela estiver.
(Foto: Wall Street Journal)
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Vou esperar vinte anos para ler a versão das filhas =)
ReplyDeleteBoa resenha ;-)
beijocas
deb
Sartre aos 3 anos? Tô passada!!! Hehehe
ReplyDeleteAssim como a Débora, também quero ver a versão das filhas daqui uns anos...
Acho louvável que ela tenha dedicado tanto tempo e empenho para a criação das filhas, mas me dá um vazio no coração só de pensar nessa infância sem amor que elas tiveram.